Com licença? Obrigado. (11/2002)

Com licença? Obrigado!

Geralmente, quando o assunto é “Software Livre vs. Software Proprietário”, as opiniões se dividem entre “aquele é bom”, “este é ruim”. E isto não chega a ser surpreendente, pois é quase instintivo classificarmos as opiniões alheias como “em afinidade com a nossa” ou “completamente equivocadas”, tudo em nome da paixão cega pela opinião própria.

Agora, o que surpreende um pouco é ver as “brigas” entre partidários do GNU/Linux e do FreeBSD, por exemplo. Mais surpreendente ainda é a quantidade de conversas de boteco, que quase terminam em pancadaria quando algum inconveniente resolve discutir qual a “melhor licença” entre a GPL e a BSD.

Já que o assunto é briga, vamos recorrer à opinião de alguém reconhecidamente bom nesse assunto: Bruce Lee. Poucos sabem, mas Bruce Lee se formou em filosofia pela Universidade de Washington, tendo escrito vários ensaios e livros. Ele criou uma nova modalidade de luta chamada Jeet Kune Do, rompendo com a rigidez formal de movimentos no treinamento de artes marciais.

Bruce acreditava que as imposições da forma impediam que as pessoas atingissem sua própria “fluência” de movimentos, por estarem sujeitos a regras que funcionaram bem para os antigos mestres, mas que não necessariamente funcionam para todos.

Ele escreveu: “Suponha que várias pessoas treinadas em diferentes estilos de artes de combate vêem de relance uma luta na rua. Estou certo de que ouviríamos uma versão diferente de cada uma. O que é compreensível, pois é muito difícil perceber uma luta (ou qualquer outra coisa) como ela realmente é, uma vez que se está ofuscado pelo ponto de vista adotado”. E, mais adiante, “A observação real começa quando se abandonam padrões pré-estabelecidos, e a verdadeira liberdade de expressão ocorre quando se está além dos sistemas…” Para concluir, “… divisores por natureza, os estilos mantêm os homens ‘afastados’ uns dos outros em vez de ‘uni-los’”.

Muito embora o todo se manifeste em cada uma das suas partes, nenhuma parte isolada é uma fiel representação do todo. Este foi o princípio que levou Lee a criar o seu “antiestilo”, algo que possibilitasse o vislumbre do todo que é composto pelas artes marciais.

Cada estilo ou arte marcial assim como cada licença de software livre têm sua própria “fluência” e motivação. A Licença GPL foi criada visando a preservar e ampliar o trabalho voluntário dos programadores, impedindo “apropriações indevidas” dos fontes. A Licença BSD foi criada por uma universidade de forma a disponibilizar seu desenvolvimento para a sociedade, ao mesmo tempo em que um financiador privado fizesse uso da pesquisa para seus fins proprietários. Não existe aí o objetivo de preservação e de construção de uma comunidade como na GPL, mas algo que as une fortemente: Ambas podem ser consideradas “livres”.

A DFSG (Debian Free Software Guidelines) define o que é necessário para uma licença ser considerada livre pelo Debian. Como o projeto tem o compromisso de ser composto apenas por software livre, foi necessária a criação de uma definição que vislumbrasse o todo das diversas licenças.

O Debian, ao procurar ser o sistema operacional universal, busca também ser independente de kernel. Existem projetos como o Debian GNU/HURD e o Debian GNU/FreeBSD em andamento, além do Debian GNU/Linux.

Fazer parte do Debian desde 1998 ajudou a desvencilhar-me de muitos vícios adquiridos, por ter afinidade com um kernel ou uma licença, e a enxergar a inutilidade dessas disputas “internas”, que só diluem a comunidade.

Que cessem as rivalidades desnecessárias, todas as engrenagens são necessárias para o correto funcionamento da máquina, não importando seu tamanho, ou se ela é GPL ou BSD.

para saber mais:

Debian Free Software Guidelines (DFSG) – www.debian.org/social_contract#guidelines

Open Source Definition (baseada na DFSG) – www.opensource.org/docs/definition.php

Eduardo Maçan – [email protected]


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