Microsoft versus GPL (09/2001)

Um dos meus artigos mais revoltados, publicado na edição de 09/2001 da Revista do Linux. Naquela ocasião a Microsoft havia acabado de declarar “guerra” à GPL, dizendo que era “antiamericana” (e eu com isso) , “coisa de comunistas”, “virótica” e outras baboseiras mais. Indignado escrevi este artigo:
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A Microsoft nos presenteou com um pouco mais de sua preocupação com o software livre. A primeira vez que reconheceu que o software livre oferecia concorrência foi quando teve de provar nos tribunais que existia alguma concorrência.

Quando a conveniência não a impede, a Microsoft planeja ataques contra seus maiores inimigos, entre eles, os padrões abertos, amplamente utilizáveis, publicamente documentados ou “comoditiza-dos”, como eles mesmos definiram nos famosos “halloween documents”.

Cada vez que um padrão verdadeiramente aberto se torna padrão de fato, a Microsoft perde a chance de criar ou manter a supremacia de um de seus produtos. Por exemplo, será que se o formato “.doc” fosse publicamente documentado e utilizável, o word seria ainda hoje o editor de textos mais utilizado? Lembre do sucesso do StarOffice, mesmo não oferecendo compatibilidade total, apenas por ter um suporte excelente ao formato “.doc”.

Agora foi a vez da GPL. Segundo a Microsoft, a GPL é anti-americana, “viral” e capaz de tornar todos os produtos de uma empresa domínio público”. Não me surpreenderia se dissessem que ela também engorda e causa câncer em ratos de laboratório.

Recentemente, desenvolvedores do FreeBSD comprovaram a utilização de partes de seu código em várias versões do Windows, o que é perfeitamente legal, segundo sua licença, mas não seria legal, segundo a GPL. A Microsoft não poderia legalmente usar código GPL (como partes do kernel do Linux) em programas proprietários.

Várias vezes no passado a Microsoft adquiriu empresas e tecnologias que poderiam se tornar concorrentes de seus produtos (ou deixou que a força de seu monopólio de sistemas operacionais as esmagasse). Com o FreeBSD não foi diferente. Para poder atingir rapidamente as condições de concorrer com a qualidade dos Unix, ela passou a “adquirir” código do FreeBSD. A diferença é que nada pagou por ele, sequer contribuiu de volta.

Declaram que código GPL é ruim porque “não permite que se construa sobre ele” e usam a Internet como exemplo de bom software livre. Mas a Internet nunca teve a ver com software livre, mas sim com padrões abertos, fóruns de desenvolvimento públicos, documentação disponível e comunidade, conceitos irrelevantes ou mesmo alheios para seus clientes.

Na verdade, só existem duas comunidades que interessam à Microsoft, a que paga por seus produtos e a que não, e dois objetivos: fazer com que a primeira continue pagando e forçar a segunda a fazer parte da primeira, não importando que métodos sejam necessários. Afinal, “os fins justificam os meios”, não é mesmo?

Nós que usamos software livre estamos na segunda comunidade, ganhando cada vez mais adeptos da primeira. E a GPL impede que a Microsoft use seus métodos para adquirir controle sobre o nosso software. Nada mais óbvio então do que atacar a GPL usando termos como “viral” para tentar conter o fluxo da primeira para a segunda comunidade. Notem, aliás, que “vírus” e uma palavra que só assusta do lado de lá.

Não acredito que a Microsoft usaria código GPL em partes de seus produtos, ainda mais tendo uma fonte tão rica como o software BSD para beber legalmente. Mas não custa nada para a comunidade usar um pouco do seu tempo verificando binários proprietários (e não apenas da Microsoft) em busca de vestígios de apropriação de trabalho voluntário.

O que mais impressiona é que mesmo que ações contraditórias ou de moral duvidosa da Microsoft venham à tona, elas não parecem abalar sua imagem frente à sua clientela. O que menos me impressiona é que ataquem o software livre ao mesmo tempo em que o utilizam em segredo. Afinal, por que iriam investir em criar eles mesmos softwares tolerantes a falhas se já investiram tanto criando usuários tolerantes a falhas?

A GPL impede que a Microsoft use seus métodos para adquirir controle sobre o software livre.


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